O Canto da Cigarra: Sátiras às Mulheres

por Augusto Gil

Dedicatória
Prefácio
Intróito
A Virtude
O Amor
O Casamento E A Família
Trovas De Pero Botelho
Dísticos I A VIII
Dísticos IX A XVI
Dísticos XVII A XXIII
Graça Imortal
A Sabedoria Das Nações I A V
A Sabedoria Das Nações VI A XI
A Esmo

Junta-te!

I - A lanterna de Diógenes

A Alvelino d'Almeida

Busquei e rebusquei entre o comum
(Comum é a soberba e a vaidade)
E entre cada mil homens, achei um!

Passei à outra metade
Da néscia e vil humanidade.
Estudei toda a mulher:
As viúvas, as casadas, as donzelas;
Pois de tantíssimas delas
- Não achei uma sequer...

«Que enorme sandeu!»
À certa dirão.

... Mas quem escreveu isto não fui eu!...
- Está na Bíblia e é de Salomão.

«Eis aqui o que achei, disse o Eclesiastes,
depois de ter conferido uma coisa com outra,
para achar uma razão, que a minha alma busca
e não pode achar. Entre mil homens achei um,
e de todas as mulheres nem uma achei!.
»
(Bíblia, Eclesiastes, cap VIII, v. 28 e 29)

II - A beleza dos senões

A Francisco Villaespesa

Certos defeitos na mulher, são laços.
Ligam, apertam, prendem mais ainda.
Quando a Vénus de Milo tinha braços
- Talvez não fosse tão linda.

III - O dilema

A Aníbal Soares

Se o pranto agita o teu divino seio,
Sinto um misto de pena e de receio.

É que não choras sem que um derrancado
Iago, cá por dentro, me sugira

- Que estás lavando um pecado,
- Ou regando uma mentira...

IV - Mater puchra filia pulchrior

A Afonso Gaio

Entraram na conversa a filha e a mamã.
A mãe era bonita. A filha era-o também.

- Esta senhora é sua irmã?
Disse eu, interrogando a mãe.

E a mãe teve um sorriso de contente,
E a filha um sorrisinho de quesília...

- Que coisa comovente
É o amor de família!...

V - Lacrymae rerum

A João Franco Monteiro

Numa carta em estilo sorridente
(Mas sobre as linhas da qual
Os meus olhos choraram longamente)
Pus este aviso final:

Por notares que manchei
Isso que em cima ficou,
- Não vás supor que chorei...

Foi água que se entornou.

VI - Jovem Lília abandonada

A Luís Barreto

Sempre que a vejo a contemplar os céus
Com ar de lírica neurastenia,
Dá-me a impressão de estar pedindo a Deus:
- Ao menos, um alferes de infantaria!...

VII - O eterno amor

A João de Deus Ramos

Pus-me a reler as tuas cartas hoje.
Há bons três anos que mas escreveste...
- Vê como o amor, vê como o tempo foge!

Entre uma delas, na maior, meteste
(Naquele dia para o que te deu!)
Umas folhas rendadas de cipreste...

São trinta cartas de apertadas linhas
Todas de Abril - do mês em que no céu
Já voam as sagradas andorinhas -.

«Juro-te amor eterno» uma dizia.
Pois afinal durou um mês por junto
O amor eterno. Quem o suporia!

Rezemos pelo defunto
Padre Nosso, Ave Maria...

VIII - Caçadores da Rua do Ouro

A Francisco Teixeira

Mas se ela te não quer, se a não apanhas
Porque a persegues com os teus derriços?

- Porque é dentro dos ouriços
Que se encontram as castanhas...