O Canto da Cigarra: Sátiras às Mulheres

por Augusto Gil

Dedicatória
Prefácio
Intróito
A Virtude
O Amor
O Casamento E A Família
Trovas De Pero Botelho
Dísticos I A VIII
Dísticos IX A XVI
Dísticos XVII A XXIII
Graça Imortal
A Sabedoria Das Nações I A V
A Sabedoria Das Nações VI A XI
A Esmo

Junta-te!

O Casamento e a Família

A José Joaquim Luís Fernandes

Quem tiver olhos para ver o ornato
Que essa manada marital enfeita...

João de Deus
(Campo de Flores. Poemetos)

Venho dum baile. Horas mortas.
Que impressões trouxe gravadas!
Os pais a verem às portas
Se as filhas são procuradas...

Quando tu foste gerada
Pôs-se o sol, nasceu a lua.
Estava tua mãe deitada,
Andava teu pai na rua.

Nos registos paroquiais
Há muitas páginas cheias
Com pais apenas legais
De criancinhas alheias...

Quando falaste em casar
Certa noite ardente, escura,
Deitaste sem o pensar
Água fria na fervura.

Nestes tempos dissolutos
Toda a mulher é vendida.
Umas vendem-se aos minutos,
- As outras por toda a vida.

Tantos namoros e ao cabo
Não houve um só que adregasse.
Casa-te com o diabo...
Para se ver o que nasce.

Lua-de-mel, luz serena
Cainda dum céu etéreo...
A primeira, a linda cena
Da tragédia do adultério.

Li agora o nascimento
Dum filho teu, no jornal
Que há cinco meses e tal
Narrava o teu casamento!

Disse-me um marido velho
De barbas brancas à Hugo:
«Este mundo é um chavelho
E nós somos o sabugo...»

Esmagas sob o espartilho
Um seio alto e perfeito...
E a boquita do teu filho
A mamar num outro peito!

Tomámos um compromisso.
Jurámos casar os dois.
Muito bem. Vamos a isso.
Primeiro tu. Eu depois...